Aumentando decisivamente sua fatia na oferta de energia renovável no País, a distribuidora Enel, a antiga AES Eletropaulo, inaugurou na quinta-feira passada (10/6) sua maior usina eólica em atividade no mundo, que já nasce também a maior entre todas na América do Sul.
Localizada no Piauí, a nova planta, batizada de Lagoa dos Ventos, foi construída a partir de um investimento de cerca de R$ 3 bilhões e tem capacidade para gerar até 3,3 TWh por ano, podendo abastecer até 1,6 milhão de residências. Além disso, composta por 230 geradores, seu tamanho físico também tem impressionado: ela se estende por 120 km, entre os municípios de Lagoa do Barro, Queimada Nova e Dom Inocêncio.
A adição do parque eólico ao grid de energia brasileiro vem em um momento oportuno para o debate sobre a relação entre as mudanças climáticas e a geração de energia. Em meio a uma crise hídrica como não se vê há 20 anos e com enorme potencial de causar o colapso no fornecimento de eletricidade, como já alertou o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), a viabilidade das energias renováveis, caso da eólica, para evitarmos futuras crises está sendo colocada em dúvida, apesar de seu inegável avanço e custo-benefício no longo prazo.
Nos últimos dez anos, segundo a Agência Internacional de Energia Renovável (IRENA), houve uma grande queda nos custos da geração por renováveis, impulsionada pelas inovações tecnológicas, a exemplo de baterias de maior capacidade, ganhos de escala e a maturidade das cadeias de suprimentos. Desde 2010, a energia solar fotovoltaica em grande escala apresentou o maior declínio de custo, 82%, seguida pela eólica onshore, em 39%, e a offshore, em 29%. Em outra pesquisa ainda mais detalhada, considerando estas três formas de geração, a BloombergNEF revela que, também nesta última década, os custos globais no investimento de equipamento e construção, financiamento e manutenção caíram, respectivamente, 83%, 62% e 58%.
Contudo, enquanto alguns congressistas aproveitam a falta de água para empurrar participações obrigatórias de termelétricas e outras energias mais caras (previstos 10% a mais no valor da conta) e “sujas” (com potencial de aumentar as emissões de carbono em 20%) no texto da MP de privatização da Eletrobras, que será votado hoje no Senado (15/6), o mercado aponta no outro sentido, como demonstrou Nicola Cotugno, diretor-geral da Enel no Brasil, em entrevista à Exame. “Respeito a necessidade de olhar para esta crise com cuidado. Mas, uma crise de um ano não significa que se deva mudar um planejamento de uma década. O desenvolvimento das renováveis tem um futuro maravilhoso no Brasil. Seria um erro conectar a crise hídrica com o direcionamento da política energética do País”, disse ele.
O executivo italiano sabe do que fala, levando em conta o cenário macroeconômico e como deveríamos nos posicionar diante dele. Os sistemas solares fotovoltaicos e parques eólicos onshore, se substituíssem apenas 500 GW gerados por termelétricas a carvão, ainda em 2021, reduziriam os custos do sistema mundial de energia em até US$ 23 bilhões a cada ano, apontam os cálculos da IRENA. As emissões anuais também seriam reduzidas em cerca de 1,8 gigatons de dióxido de carbono, equivalente a 5% do total de emissões globais em 2019.
Nesse sentido, é fato que a Enel, assim como outras distribuidoras, coloca o dinheiro onde a boca está, por assim dizer. Desde dezembro passado, a recém-inaugurada usina eólica de Lagoa dos Ventos já tem planos para a sua expansão, com previsão de somar mais 72 geradores a partir de um investimento adicional de 360 milhões de euros.