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A transcendência do amor: uma análise ecocrítica de Interstellar (2014)

Cuidar, nutrir e proteger nosso lar é a única solução plausível
ilustração de Catherina Suleiman

Por Giovanna Suleiman

 

 

“O amor é a ponte entre você e tudo.” 

– Rumi 

 

“Tudo, tudo o que eu entendo, eu entendo somente porque eu amo.” 

– Leo Tolstoy

 

Uma névoa pesada envolve o horizonte. O céu, antes azul, agora está manchado e acinzentado e agita-se com poeira implacável. Vastos campos de milho se estendem infinitamente, não em abundância, mas em desespero, o último sussurro da generosidade da natureza antes que o próprio solo não resista. O sol, pálido e cansado, paira baixo no céu, lançando uma luz fraca sobre a desolação e o ar é difícil de respirar para dentro dos pulmões. No entanto, ainda existem pessoas olhando esse horizonte de desolação e procurando formas possíveis de sobreviver. 

Antes de mais nada, gostaria de pontuar que não temos como opção partir da Terra para outros planetas ou dimensões e nem deveríamos considerar isso como uma solução mesmo se tivéssemos. Cuidar, nutrir e proteger nosso lar é a única solução plausível. No entanto, o filme tem outras mensagens importantes para transpassar. Mensagens que permeiam uma visão ecocrítica necessárias para acordar todos os dias, abrir a janela, olhar um céu que reflete a violência contra a Terra e ainda assim ter esperança. Nas palavras do autor e ativista ambiental, Wendell Berry: “Cuidar do que resta da Terra e promover sua renovação é nossa única esperança legítima de sobrevivência.”

Um dos temas mais esperançosos em Interstellar é a ideia de que o amor transcende o tempo e o espaço, servindo como uma força que conecta indivíduos através de vastas distâncias. No longa o amor foi a ferramenta utilizada para salvar a humanidade. A ecocrítica pode interpretar isso como uma metáfora para a interconexão de toda a vida — humana e não humana — e a ideia de que laços emocionais e éticos devem guiar o comportamento humano em relação ao meio ambiente. Aqui fico com as palavras de Timothy Morton em sua obra Ecology Without Nature: Rethinking Environmental Aesthetics (2007), em que o autor apresenta o amor como uma forma de ativismo, um compromisso com a preservação do mundo natural diante da exploração atual da Terra:

“Em um mundo onde o meio ambiente é cada vez mais mercantilizado, o amor pela natureza deve ser um ato radical de devoção, um que resista à exploração e defenda o mundo não humano.”

Assim como no longa, acredito que o amor é a ferramenta mais transcendental. Mas para aplicar o amor no nosso cotidiano precisamos compreender que: “O amor não é um privilégio humano; é uma força terrestre, presente em todas as interações entre os seres vivos. Para amar bem, precisamos aprender com os relacionamentos simbióticos e cíclicos que sustentam a vida.” De um ponto de vista ecocrítico, nosso amor com a Terra precisa compreender e respeitar seus ciclos. Dar o mesmo tanto de cuidado que recebemos. Assim como ocorre na natureza que comporta milhares de exemplos simbióticos de cuidados, aqui vou deixar apenas um deles de tantos:

No coração da Amazônia, onde a copa sussurra para a terra, está a árvore Cecropia. Não é uma árvore comum, pois dentro de seus caules ocos zumbe um mundo secreto, vivo com o ritmo das formigas astecas. A Cecropia, uma sentinela verde, abre seus braços para o céu, oferecendo abrigo e sustento para seus pequenos guardiões. Na segurança de seu núcleo oco, as formigas constroem seu lar, um labirinto dentro do abraço da árvore. De suas veias, a árvore oferece um presente, os corpos müllerianos — pequenas e preciosas pérolas de nutrição — seu tributo às formigas que vivem dentro. Mas como tudo na natureza, é um ato de cuidado simbiótico. Na natureza nada é dado sem um retorno natural. As formigas astecas, sempre vigilantes, patrulham as folhas como soldados em dever sagrado. Quando o perigo se aproxima — um inseto rastejante ou um herbívoro pastando — as formigas se levantam em feroz defesa. Elas enxameiam, picam e mordem, afastando qualquer ameaça que ouse se banquetear no verde delicado da Cecropia. Assim, um pacto é mantido, antigo como a própria floresta. A árvore, crescendo rapidamente em direção à luz, floresce sob a proteção das formigas. As formigas, por sua vez, prosperam dentro do santuário da árvore. Juntas, elas permanecem, um testamento vivo do equilíbrio da natureza — uma simbiose, onde a vida nutre a vida, em uma dança tão antiga quanto a terra abaixo delas. Uma dança que como espécie humana infelizmente esquecemos e estamos tentando relembrar. Assim como tentamos relembrar diariamente o amor. 

No diálogo sobre o amor, Dra. Mann fala para Cooper: “O amor não é algo que inventamos. É observável. Poderoso. Tem que significar alguma coisa. Talvez signifique algo mais, algo que ainda não podemos entender. Talvez seja alguma evidência, algum artefato de uma dimensão superior que não podemos perceber conscientemente. O amor é a única coisa que somos capazes de perceber que transcende as dimensões de tempo e espaço.” Saliento a importância de imergir por completo no ato radical de devoção do amor com nosso lar. Em muitos lugares do Brasil já não reconhecemos mais o céu que nos encobre. Assim como Cooper fala: “Agora você precisa me dizer qual seu plano para salvar a Terra”. Acredito que a resposta se inicia no amor. Ele é a maior força condutora para ações, revoluções e mudanças. Para atos de carinho, devoção e respeito. Ele é a força condutora do cuidado, de reconhecer o outro. Para lembrarmos da dança simbiótica da natureza. De se descentralizar a ponto de proteger. Tal qual as formigas protegem seu lar. Essa é a faísca inicial mais importante para a ecocrítica. 

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